pintura / instalação

Museu da República

(detalhes)











          Olhar a obra de Enrique Banfi nos faz relembrar pensamentos que passamos a transcrever e que talvez nos ajudem a refletir:

Sobre o sujeito da criação

"A percepção como encontro entre coisas naturais está no primeiro plano da nossa pesquisa, não como simples função sensorial que explicaria todas as outras, mas como arquétipo do encontro original, imitado e revelado no encontro do passado, do imaginário, da idéia." (1)

"0 mundo é inseparável do sujeito, mas de um sujeito que é só projeto do mundo; e o sujeito é inseparável do mundo mas de um mundo que ele mesmo projeta." (2)

"0 sujeito da sensação não é nem um pensador que nota uma qualidade, nem um meio inerte que seria afetado por ele; ele é uma força que co-nasce num certo meio de existência e se sincroniza com ele." (3)

Sobre a matéria

"A dialética do duro e do mole comanda todas as imagens que fazemos da matéria."(4)

"A imaginação da resistência que nós atribuímos às coisas dá a primeira coordenação às violências que nossa vontade exerce contra elas." (5)

"A dureza e a moleza das coisas nos engajam forçosamente em tipos de vida dinâmica diferente. 0 mundo resistente nos lança fora do ser estático e os mistérios da energia começam" (6)

"Ao estudarmos as imagens naturais, descobrimos a imago da nossa energia, ou seja, a matéria é nosso espelho energético: é uni espelho que focaliza nossos poderes e os ilumina de alegrias imaginárias." (7)

"Ao experimentarmos, no trabalho de qualquer matéria, essa curiosa condensação de imagens e de forças, nós viveremos a síntese da imaginação e da vontade."(8)

Sobre o corpo do sujeito que cria


"Matéria e mão devem estar unidas para dar o ponto nodal do dualismo energético, dualismo ativo que difere do dualismo clássico do objeto e do sujeito. A mão que trabalha coloca o sujeito numa nova ordem, na emergência mesmo de sua existência dinâmica." (9)

'Já dissemos, um valor, um tom não dependem unicamente das propriedades e dos relacionamentos entre os elementos que os compõem, mas da maneira como eles são colocados, isto é, 'tocados'. (10)

"Eu não quero modelar o que eu vejo, mas o que eu pressinto através do sentido da visão e o que eu imagino. Para mim o assunto de interesse mais profundo é descobrir como organizar a cor e a forma dos objetos afim de dar a estes sentido, e sempre tendo em conta o material e o espaço de que disponho, salvaguardando o seu caráter orgânico."(11)

"A mão também tem seus sonhos, ela tem suas hipóteses. Ela ajuda a conhecer a matéria na sua intimidade. Ela ajuda, portanto, a sonhar."(12)

Sobre o ato de dar forma

"A forma dos objetos não é seu contorno geométrico: ela tem urna certa relação com sua natureza própria e fala a todos os sentidos ao mesmo tempo que à vista." (13)

"É meu olhar que subentende a cor, é o movimento de minha mão que subentende a forma do objeto ou mais certamente meu olhar se acasala com a cor, minha mão com o duro e o mole, e nesta troca entre o sujeito da sensação e o sensível não se pode dizer que um age e que outro sofre, que um dá sentido ao outro." (14)

"A mão ociosa, que a apenas acaricia e que percorre um trabalho de linhas bem feitas, pode se encantar com uma geometria fácil." (15)

"A mão trabalhadora e imperiosa aprende a dinamogenia do real ao trabalhar a matéria que muitas vezes resiste e cede como uma carne amante e rebelde. Ela acumula todas as ambivalências. Tal mão ao trabalhar tem necessidade da justa mistura de terra e de água para melhor compreender que esta matéria é capaz de uma forma, uma substância capaz de uma vida." (16)

Sobre o material escolhido

"É claro que certas coisas se prestam mais do que outras a serem degustadas; porque o gosto não estetiza soberanamente e arbitrariamente, ele responde à uma solicitação do objeto: o apelo do vinho não é igual ao da água, nem o porta-garrafas de Duchamp estimula da mesma forma que uma estátua." (17)

"A imaginação material, a imaginação dos quatro elementos, gosta de brincar com imagens que combinem mais de um elemento, mesmo se ela favorece apertas um deles." (18)

"Os mestres do Extremo Oriente, para quem o espaço é essencialmente o lugar de metamorfoses e de migrações e que sempre consideraram a matéria como encruzilhada de um grande número de passagens elegeram, entre todas as matérias da natureza, aquelas que são mais 'intencionais' e que parecem elaboradas por uma arte obscura." (19)

Rosa Maria Lellis Werneck
Mestre em Estética, Professora da UFRJ



Autores citados: Merleau-Ponty - 1,2,3,13,14 / Gaston Bachelard - 4,5,6,7,8,9,12,15,16,18
/ Focillon - 10,19 / Bernard-Leach - 11 / M. Duffrene - 17